terça-feira, 30 de dezembro de 2014

BINHO PAIVA

Faz tempo que o blog não publica causos, não porque eles não existam, mas apenas por preguiça de registrá-los na nuvem e compartilha-los com meus fiéis seguidores. Gostaria que o retorno fosse causado pelo fim dessa preguiça pantaneira, mas infelizmente está sendo por um motivo bem mais grave: a morte prematura e inesperada de um dos principais inspiradores e/ou protagonistas de diversos causos, meu pai Binho Paiva.



Se a tristeza pela partida é inevitável, o jeito é tentar reduzi-la registrando alguns causos exclusivamente dele, como o próprio apelido.

O nome escolhido pelos meus avós para batizar o primeiro filho homem era Roberto, mas meu pai veio ao mundo em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, em que os diversos países "Aliados" combatiam os três países pertencentes ao "Eixo", que eram Itália, Alemanha e Japão. Ocorre que a primeira sílaba das capitais desses países formavam exatamente o nome Roberto, o que poderia ser considerado uma provocação, uma afronta, uma defesa dos inimigos do Brasil na época.

                Itália                   -->          ROMA                -->          RO
                Alemanha           -->          BERLIM              -->          BER
                Japão                  -->          TÓQUIO             -->          TO

Temendo represálias a um nome "suspeito", o jeito encontrado pelos meus avós foi mudar para "Rubens" e deixar "Roberto" para o próximo filho, que nasceu quando a Guerra já havia acabado e não havia mais risco de serem mal interpretados. Por esse causo, meu tio virou Beto e meu pai passou de Rubens para Rubinho e daí para Binho. E foi Binho até o fim da vida.

E foi como Binho que ficou conhecido na família, no círculo de amigos, nos clubes que frequentou e no trabalho. Haviam algumas pequenas variações, como tio Binho ou tio Rubinho na família ou "seu" Binho, que era como alguns dos meus amigos o chamavam, misturando a formalidade do "senhor" com o conhecido apelido carinhoso, mas o normal era apenas Binho.

Durante algum tempo, quando se tornou chefe da agência do banco em que trabalhava, tentou impor algum respeito e passou a atender o telefone identificando-se como "Rubens". Os clientes tratavam-no formalmente nesses casos, até que chegavam à agência e procuravam pelo tal Rubens. Quando indicavam o meu pai, a saudação era imediata: "Ô Binho, você que me atendeu !!!?!!! Que bom, o assunto é o seguinte...". Em pouco tempo ele desistiu de tentar impor o nome completo e adotou o Binho pelo qual era muito mais conhecido.

Outra coisa engraçada é que em Amparo existiam dois Rubens Paiva. Embora ambos tivessem um outro sobrenome, os dois eram conhecidos apenas como Binho Paiva. Sorte que a lista telefônica da cidade tinha o endereço também, então após algumas ligações erradas, o pessoal ia se acostumando. Convém lembrar que estou falando de uma época pré-celular e agendas eletrônicas, em que o jeito para descobrir o telefone de alguém era pesquisando na lista em papel mesmo.


Vai com Deus, Binho. Espero poder sempre honrar teu nome. Obrigado por ser para sempre o meu pai.


domingo, 22 de junho de 2014

O Terminal

Ontem me senti assistindo novamente ao filme O Terminal, de 2004, aquele em que o Tom Hanks chega aos Estados Unidos, o país de onde ele veio sofre um golpe de Estado e ele é obrigado a ficar no aeroporto de Nova York sem poder entrar nos USA nem voltar para o seu país. Aconteceu parecido enquanto eu dava plantão na fronteira terrestre entre Brasil e Bolívia, ontem.



Sim, ontem, sábado, para os engraçadinhos que adoram rir dos meus descansos mas não sabem das minhas horas de trabalho.

Passava um pouco das 18 horas quando um casal aparentemente de gringos procurou a RFB para saber o que fazer a respeito da imigração (responsabilidade da Polícia Federal, não da Receita Federal, mas nas fronteiras normalmente os dois órgãos são muito confundidos). Eles haviam saído da Bolívia, carimbado normalmente os passaportes, mas não podiam dar entrada no Brasil porque a PF já havia encerrado as atividades naquele horário.

A sorte é que apenas a mulher é alemã, o rapaz é brasileiro, então pelo menos a comunicação foi fácil. Difícil foi explicar para a moça que o melhor era ela entrar no Brasil, passar a noite em Corumbá e procurar o posto da PF no dia seguinte, para regularizar a situação. E o medo dela em ser presa no Brasil por entrada ilegal ?! Ela queria passar a noite na ponte entre Brasil e Bolívia, pois na lógica alemã e racional dela, eles não podiam voltar para a Bolívia porque já haviam saído de lá, mas também não podiam entrar no Brasil porque a Imigração brasileira não havia autorizado a entrada deles. Ela queria passar a noite dentro do carro e ainda estava com medo de ser detida.

Após muita conversa para explicar a diferença entre Alemanha e Brasil (e entre Bolívia e Brasil, que também é muito grande mas eu não posso contar sem gerar um incidente diplomático), eu e um colega conseguimos convencê-los a passar a noite em Corumbá e voltar até a fronteira no dia seguinte, sem medo de prisão ou algo do gênero.

O final da história eu não sei com certeza, mas posso dizer que encontrei com o casal hoje pela manhã, andando pela cidade, antes de voltarem à fronteira para regularizarem a situação. Conversei com eles e a alemã estava feliz da vida por ter aproveitado a Festa Junina de Corumbá sem ser presa.


sábado, 31 de maio de 2014

Indenização ou Resgate ?


Final da Copa das Confederações de 2013, Brasil e Espanha se enfrentando no Rio de Janeiro e a galera reunida para fazer um churrasco antes do jogo. Comida, bebida, conversa fiada, risada... tudo o que se deseja numa tarde animada entre amigos.

Todo mundo alimentado, carvão apagado, música desligada para acompanhar o jogo. Brasil 3 x 0 Espanha. Vitória incontestável da seleção canarinho sobre a "Fúria", campeã do mundo! Vamos recomeçar o churrasco, é claro !

Mas era necessário dar um reforço na cerveja e no gelo, afinal o jogo durou apenas 90 minutos, mas o churrasco estava partindo para a prorrogação. Professor, o dono da casa, resolveu sair para comprar as coisas que faltavam, mas como estava alguns graus de cerveja acima do permitido, Michel - o Bonitinho - foi com ele para fazer companhia. E eis que deu-se o acidente.

Professor, ao manobrar na frente da loja de conveniência, subiu com a caminhonete sobre o capô de um carro que estava estacionado atrás. O proprietário do carro exige uma indenização, é claro, ameaça chamar a polícia acusando o Professor de estar bêbado e aquela situação toda que só quem já se envolveu em acidente - leve - de trânsito sabe como é.

Conversa vai, conversa vem, o Professor oferece R$ 500,00 para consertar o capô amassado e riscado do carro e resolver o problema ali mesmo. Os olhos do motorista brilham, porque o carro é tão velho e tão caindo aos pedaços que é capaz dele conseguir trocar o veículo inteiro com essa grana, e aceita a oferta de indenização na mesma hora. Mas se recusa a receber em cheque; só aceita dinheiro vivo.

O Professor diz então que vai até o caixa eletrônico e volta com o dinheiro, mas o dono do carro, desconfiado, exige que o Professor deixe uma garantia. E qual a garantia que ele oferece? O nosso amigo Michel, que aceita ficar de "refém" enquanto o Professor vai sacar o dinheiro. Ou seja, o que era para ser uma indenização de acidente de trânsito acabou virando um pagamento de resgate!

Sorte que o Professor tinha os R$ 500,00 no banco e, apesar de toda a cerveja, lembrou de ir resgatar o amigo, antes de voltarem para a casa com as compras. A história deixou a prorrogação do churrasco muito mais divertida. E, ainda melhor, a indenização - ou o resgate - nem entrou na vaquinha para pagar as despesas.


sábado, 24 de maio de 2014

O Teste da Bacia

O Paiva viajava muito a trabalho, ficava dois, três dias fora e algumas vezes a semana toda. Mas (quase) sempre passava os finais de semana em casa e nesses finais de semana aproveitava para encontrar a turma, organizar algum jantar ou participar de algum churrasco. E nesses encontros sempre estava presente o amigo mais palhaço do Paiva, que adorava provocar a esposa ciumenta sobre as viagens do marido.

Até que ele divulgou o Teste da Bacia.


A recomendação era simples. A esposa do Paiva deveria comprar uma bacia grande, daquelas de alumínio que as lavadeiras de beira de rio usavam, e deixar preparada para os dias que o marido voltasse das viagens. Deveria colocar água até a metade, mais ou menos, e garantir que não estivesse nem muito quente, nem muito fria. E quando o Paiva chegasse, ele deveria tirar a roupa e se sentar pelado dentro da bacia, na água, para fazer o teste.

A conclusão era simples: se "as partes" afundassem, sinal que estavam cheias e não havia com o que se preocupar. Mas se boiassem... sinal que os "recipientes" tinham sido usados e estavam vazios, indício mais que suficiente para uma bela discussão, no mínimo.

Será que foi por isso que o Paiva passou a andar com pedacinhos de chumbo dentro dos bolsos ?!?!




segunda-feira, 19 de maio de 2014

Suco de Fruta Baiano

Parece aquela piada do sujeito que entrou em um restaurante na Bahia e pediu um suco de laranja sem açúcar, insistindo para que o garçom trouxesse SEM AÇÚCAR, e 45 minutos depois vem um suco com um monte de açúcar no fundo do copo. Chama o garçom de volta e reclama da demora e que o pedido veio errado. O garçom dá aquela olhada preguiçosa no copo e fala com toda a mansidão baiana, de quem não está com nenhuma disposição de trocar o copo:

"Faça o seguinte meu rei, não mexe no fundo não"

Pois aconteceu bem parecido em uma pousada que o Paiva ficou hospedado. Como foi o primeiro a chegar no restaurante para o café, a garçonete perguntou qual suco ele queria, oferecendo laranja, caju, cajá, umbu, cacau e manga. O Paiva escolheu manga.

O suco foi servido razoavelmente rápido e estava gostoso. Enquanto tomava o suco e o restante do café, apareceu um casal no restaurante e a garçonete foi atender. Levou as comidas, o leite, o café e dois copos de suco de manga. A moça do casal fez uma cara feia e o maridão questionou se não tinha suco de outras frutas, ao que a garçonete respondeu:

"Tem sim, mas é que o de manga eu já fiz, tá pronto". E deu as costas sem mais cerimônia.

O Paiva deu risada baixinho e ficou com vontade de orientar o casal a chegar mais cedo no dia seguinte, mas vai que eles seguem a dica e escolhem um sabor que o Paiva não gosta.



segunda-feira, 12 de maio de 2014

Dicionário Infantil

Quando os bebês começam a falar, os adultos que convivem com essas crianças tornam-se adivinhos e tradutores, esclarecendo (nem sempre) as palavras e frases incompreensíveis para os adultos mais distantes. Eles trocam letras, erram na concordância, na pronúncia e assassinam a lógica, mas se fazem entender pelos sons e pelo charme de só quem está aprendendo a se comunicar consegue transmitir. Algumas das pérolas dos bebês na vida do Paiva:

  • bejo - baço:  beijo e abraço (maneira nem sempre sutil de encerrar a conversa)
  • boneide:  band-aid
  • detupa:  desculpa
  • Estados dos Nidos: Estados Unidos
  • madinha: madrinha
  • madrrrrinha: madrinha
  • Mato Gosso: lugar longe, onde mora o padrinho, e onde só é possível chegar de avião, depois de atravessar um rio bem grandão
  • música portuguesa: música brasileira (cantada em português, claro)
  • neguá: lugar
  • quiaquinis: dinossauro herbívoro (?!!?!!)
  • quininho: pino pequeno
  • quinininho: pequenininho
  • pepichupi: catchup
  • pi: padrinho (?!?)
  • repângalo: relâmpago
  • 1, 2, 3, 7, 9, 11: novo sistema decimal

A maior parte dessas palavrinhas mágicas foi proferida pelo afilhado Mateus, mas tem criação da afilhada Mirela também.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Todos os Sexos

No último ano da faculdade de administração de empresas, é comum a luta dos alunos por vagas nos programas de trainee das melhores empresas. Normalmente são diversas fases, com testes psicotécnicos, dinâmicas, jogos e entrevistas, eliminando candidatos à cada etapa, apertando o funil.

O Paiva participou de diversas dessas seleções e se lembra particularmente de uma delas, numa multinacional, onde já estava na fase de dinâmica de grupo. Eram cerca de 20 candidatos reunidos numa sala, realizando diversas atividades em grupos maiores ou menores, acompanhados de alguns psicólogos que coordenavam o processo e diversos gerentes e diretores da própria empresa, atuando como observadores.

A última das atividades era para os grupos construírem cidades com sucatas diversas, embalagens de papelão e isopor de diversos tamanhos e formatos, usadas para emular prédios. Enquanto os candidatos interagiam para decidir sobre ruas, bairros, prédios públicos e zonas comerciais, os psicólogos, gerentes e diretores só acompanhavam, para observar como cada um reagia aos aspectos de iniciativa e liderança.

Ao término do tempo programado todos os candidatos tinham que descrever o que acharam da experiência. Foi então que um candidato mais empolgado começou o seu discurso, mais ou menos assim:

"Acho que a atividade foi muito boa, pois proporcionou a todos nós a oportunidade de interagir com os demais, aceitando as diferentes opiniões, respeitando as diferenças entre todos as culturas, todas as religiões, todas as idades, todas as classes sociais, todas as faixas de renda, todos os sexos e todas as experiências pessoais de cada um, para atingir o objetivo comum de todos."

Era bonito, apesar de exagerado. Mas um detalhe não passou despercebido por um dos diretores. Quando foi a vez dos funcionários se manifestarem sobre o que haviam observado da dinâmica, esse diretor pediu a palavra e se referiu ao jovem do discurso decorado:

"Achei interessante o que o rapaz ali falou sobre a participação de todas as culturas, todas as religiões, etc, mas fiquei curioso para saber quais são TODOS os sexos? Eu só conheço 2."

Na verdade, eram outros tempos. O candidato foi reprovado.


sábado, 3 de maio de 2014

Bombinhas - parte 3

Como eu já contei na parte 2 do causo eu, Fernando e André saíamos todos os dias para fazer as aulas de mergulho. E o Du, que estava adoentado, ficava no apartamento para se recuperar. Até demos uma fugida da aula e fomos para o Beto Carrero num dia, quando o Parque ainda era mais um mapa bonito e cheio de promessas do que atrações reais e funcionando, mas o "normal" era o Du se refugiar no apartamento e na praia em frente.



O problema é que o André tinha um celular Motorola, do tipo "tijolão", que precisava de 5 horas ligado na tomada para carregar, para funcionar uns 15 minutos. E estava com uma namorada nova, para quem ele ligava todo dia, escondido na lavanderia para a gente não ouvir o que conversavam. Até que a curiosidade do Du falou mais alto e ele resolveu analisar o brinquedinho do André, numa das tardes ociosas. E não conectou direito o carregador depois. Quando chegamos à tarde, o André pegou o telefone no quarto, tirou da tomada e foi para a lavanderia fazer sua ligação diária. E voltou segundos depois, bufando de raiva, com o celular descarregado numa mão e a outra com vontade de dar um soco no amigo. A solução foi apelar para o orelhão da rua, mas sem a privacidade da lavanderia para usar os apelidos carinhosos do casal de pombinhos.





Com todos os acontecimentos, a volta não poderia ser tranquila. Subindo a serra antes de Curitiba, a F-1000 ficou ingovernável. Deslizava de um lado para o outro sem controle. Na primeira escapada, pensei que havia óleo na pista, ou que havia exagerado na velocidade com a pista molhada pela garoa. Mas quanto mais devagar eu ia, pior ficava para dirigir. Quando chegamos ao planalto, encostei no acostamento para ver o que estava acontecendo e as rodas estavam completamente desalinhadas. Cada uma apontava para um lado. Resolvemos voltar até um posto que havíamos acabado de passar, mas bastou engatar a ré e tentar andar, para alguma coisa estourar embaixo da caminhonete. A solução foi chamar o seguro, despachar o Du para o carro do Fernando, junto com o André, e seguir viagem de guincho até Curitiba, onde um mecânico fez uma gambiarra. Ah, sim, e deu outra carga na bateria, que descarregou novamente por causa do som e do pisca alerta ligado.


Ao chegar em casa ainda descobrimos que trouxemos a chave do apartamento alugado. Era para deixar num local combinado, no próprio prédio, mas viemos com ela para São Paulo. A viagem dos causos havia acabado, mas não as consequências. Só para constar, o André casou com aquela namorada e estão juntos e felizes até hoje.


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Bombinhas - parte 2

Chegamos em Bombas, nosso destino final, já bem tarde, sem nenhum outro contratempo, por incrível que pareça. No dia seguinte saímos para explorar a cidade e o distrito vizinho de Bombinhas. Muito turista brasileiro, muito turista argentino e muita escola de mergulho. Não tínhamos planejado nada a respeito, mas já que estávamos no paraíso do mergulho, por que não aproveitar para fazer um batismo ?

Os batismos tinham um preço razoável, mas eram muito caros se comparados com o custo do curso total para termos a carteirinha da PDIC. Se fizéssemos o mergulho acompanhado seria legal, mas se fizéssemos o curso completo, seria muito legal, nos tornaríamos mergulhadores e poderíamos explorar diversos outros pontos de mergulho pelo Brasil e, quiçá, pelo Mundo. A carteirinha era internacional.

O Du, que mal conseguia respirar em terra firme, por causa da gripe forte, não se animou. Os demais tiveram a certeza que tinham encontrado a atividade perfeita para a semana de férias. As aulas práticas eram numa praia, pela manhã cedo, e as teóricas eram à noite, no centro da cidade. Seria fantástico, um negócio da China, se não estivéssemos de férias e com a pretensão de não termos compromisso. Viajamos 770 quilômetros para descansar e logo no primeiro dia nos inscrevemos num curso que nos obrigava a ter horário de manhã e à noite. Que saco!

Além disso, o Paiva tinha 4 graus de miopia, e o mergulho autônomo é SEM óculos. Ao final de cada aula, todos discutiam as belezas que tinham visto no fundo do mar, e o Paiva mal tinha visto um ou outro peixinho sem graça.


Mas o pior ainda estava por vir, como sempre. As aulas eram na beira da praia, entrávamos caminhando com o equipamento a partir da areia, nadávamos, afundávamos e aplicávamos o que tínhamos aprendido nas aulas teóricas do dia anterior. Sempre com a mesma roupa velha até a coxa e o mesmo lastro (cinturão de chumbo que o mergulhador leva na cintura, para compensar a flutuação natural causada pela roupa e pelo cilindro de ar). Mas a última aula seria nas proximidades de uma ilha, onde havia um naufrágio, necessário pegar uma barco para chegar até lá.


Só que eu, além de cego, passo mal em embarcação. Difícil dizer o que dava mais raiva, ser o único a passar mal enquanto todos estavam aproveitando a paisagem e ansiosos com o mergulho, ou aguentar o piloto do barco comentando que em muitos anos fazendo aquele percurso, pouquíssimas vezes tinha visto o mar tão calmo. Meu estômago não achava o mesmo.

Depois de vomitar umas 2 ou 3 vezes, coloquei a roupa de mergulho (nova, até o tornozelo), o lastro de sempre e mergulhei com o resto do grupo. Na primeira inspirada mais forte, cadê o Paiva? Flutuei até a superfície e não conseguia mergulhar mais. O professor voltou e me puxou para baixo pela nadadeira. Na próxima inspirada mais forte um pouco, flutuei de novo. O professor voltou atrás de mim e explicou que eu deveria tentar ficar com a cabeça sempre mais baixa que o tronco e os pés, para não "subir" de novo.


O problema é que todas as aulas eu fiz com uma roupa velha, com bermuda. E o batismo fiz com uma roupa nova, de calça. Só então descobri que quanto mais nova e maior a cobertura da roupa de neoprene, mais ela ajuda na flutuação. Ou seja, eu deveria ter colocado mais lastro. Mas por que ninguém me contou isso antes?!


Apesar da gozação dos companheiros - e de vomitar uma vez mais na volta para a praia - dessa vez consegui ver alguns peixes a mais. E decidi fazer a cirurgia da miopia naquele mesmo ano.

Ah, sim, apesar de todo o esforço e dedicação em cumprir os horários das aulas práticas e teóricas por 1 semana de férias, nenhum de nós nunca mais mergulhou na vida.


quinta-feira, 1 de maio de 2014

Bombinhas - parte 1

É difícil acreditar que tanta coisa engraçada pudesse acontecer em uma única viagem, mas quando os 4 Patetas se reuniam os anjos protetores trabalhavam dobrado - ou também tiravam férias, vai saber?! Vou mudar temporariamente a regra dos causos e dividir a história em diversas partes, além de colocar os nomes verdadeiros. Merecemos o registro dessa aventura.

Tudo começou ainda antes da viagem propriamente dita, com o Du anunciando que estava doente, foi ao médico e a recomendação expressa do doutor era "repouso absoluto e nada de viagem". Como assim, na véspera da nossa viagem de 1 semana e 770km entre Amparo/SP e Bombinhas/SC ? De jeito nenhum, não podemos ter uma deserção tão importante, e tão em cima da hora. Compra os medicamentos, as injeções, arruma as malas e vamos embora que pior do que está não vai ficar!

Os patetas que moravam em Amparo (Du, André e Paiva) seguiram de F1000 até Sorocaba e se encontraram com o pateta faltante, dividindo a tropa no Monza do Fernando e batendo ponto na Padaria Real, como era "tradição" desde a viagem do ano anterior (leia o causo Estrada Esburacada).


Era uma viagem de umas 10 horas, mas três coisas fizeram a gente se atrasar muito mais que o planejado: um congestionamento na BR-116, as paradas para o André aplicar injeção no Du e uma chuva torrencial que caiu quando estávamos em algum lugar depois de Joinville.


As paradas para aplicar injeção eram as mais engraçadas. O André era dentista, tinha experiência com seringas, agulhas e remédios, mas na primeira parada ele se atrapalhou todo com o álcool, o esparadrapo e as demais traquitanas espalhadas pela porta traseira da caminhonete e deixou a seringa espetada no braço do Du enquanto procurava um algodão novo para passar depois da injeção. Quem passava pela estrada e via aquele grupo de jovens parado no acostamento, um com uma seringa espetada no braço e dois se acabando de dar risada à toda, tinha a certeza que éramos todos drogados. Não sei como não fomos presos pela polícia rodoviária!

Mas o pior ainda estava por vir. Escureceu e começou a chover forte. Resolvemos estacionar na beira da estrada para esperar a chuva diminuir um pouco, mas ficamos com o rádio e a lanterna da caminhonete ligados. É claro que a bateria foi pro saco. A primeira ideia foi empurrar. Mas quem consegue empurrar uma F1000 carregada de roupa, comida e cerveja para 4 caras, por 1 semana? Sem chance.

A segunda ideia foi um pouco pior. Encostar o Monza no lado e fazer uma "chupeta". O Du, doente e com febre, não sabia se segurava o guarda-chuva para manter o motor do carro seco, enquanto colocávamos os cabos, ou se protegia a si próprio. Mais uma triste descoberta: o motor de um carro de passeio não é suficiente para dar a partida numa F1000 diesel. Muito pelo contrário, quando o Paiva encostou na chave da F1000, quase que o Monza também fica sem bateria. Por um instante vimos toda a energia dele se esvair, mas ainda sobreviveu, por pouco.

A terceira ideia foi voltar para a primeira. Fernando, André e Du (coitado !) conseguiram empurrar cerca de 3 metros e o Paiva deu um único "tranco" certeiro: pegou!

Com aquela movimentação toda, algumas pessoas foram se aglomerando na frente do estabelecimento comercial onde ocupávamos o estacionamento, para assistir a cena. Achávamos que ninguém tinha se oferecido para ajudar por causa da chuva, que continuava forte, mas depois que fizemos os carros funcionarem e conseguimos iluminar melhor a fachada, descobrimos que o motivo mais forte era outro: estávamos na frente de uma.... ããã... um puteiro!

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Estrada Esburacada

Os quatro amigos - internamente conhecidos como 4 Patetas - fizeram uma viagem de Amparo/SP para Santa Catarina, passando por Sorocaba para reunir o quarto competente da tropa. Saíram cedo, para tentar evitar o trânsito do feriado prolongado, mas se distraíram com a paisagem da Serra de Tapiraí e chegaram nas bordas da BR 116 depois de muitos outros viajantes.

A BR estava congestionada, tudo parado, e o rádio da caminhonete avisando que o problema era um acidente, com muita demora para a retirada dos caminhões. Querendo recuperar o tempo perdido, os patetas pararam no acostamento, sacaram o mapa rodoviário e abriram aquela folha enorme de papel em cima do capô. Já existia celular na época, mas serviço de rastreamento por satélite, GPS, internet móvel e outras maravilhas semelhantes não era sonho distante - era sonho inexistente mesmo.

Vira mapa daqui, procura localização dali, alguém encontrou uma estradinha, paralela à BR, que permitiria voltar para a estrada principal logo depois do acidente. Era coisa de uns 30 km em estrada vicinal, mas comparada às condições da rodovia, valia a pena arriscar. E arriscaram.
Amarrotaram todo o mapa - dobrar certo aquele troço, depois que desdobrou a primeira vez, só quem já passou por isso sabe como é impossível - saíram da rodovia e acharam a estradinha. Logo no início, uma placa de alerta:

Buracos na rodovia próximos 15 km

Dúvida no ar: enfrentar os buracos ou voltar para o congestionamento? Bom, se a estrada tem 30 km e os buracos estão em "apenas" 15, vamos seguir.

Desvia daqui, desvia de lá, difícil fazer mais que 40 quilômetros por hora naquela buraqueira infernal. E o motorista olhando ansioso para o odômetro parcial, controlando a distância percorrida e esperando a hora de acabar com o suplício, antes que os buracos acabassem com o carro. Quando o instrumento no painel marcou 14,8 km e os viajantes já estavam suspirando aliviados, apesar do CD pulando (MP3 também era sonho), do enjoo, da dor na coluna e das cabeçadas no vidro, outra placa:

Buracos na rodovia próximos 15 km.

Precisa de comentário ?


segunda-feira, 21 de abril de 2014

O Furto do Século

Faz tempo que o Paiva não passa por aqui para contar seus causos, mas resolveu dar o ar da graça no feriadão porque se lembrou de um ocorrido exatamente nessa época, muitos anos atrás.

A turma estava toda na praia. Foi para Caraguatatuba explorar as belezas do litoral norte de São Paulo e reclamar do trânsito para descer a serra, da fila para comprar pão, da areia e do sol escaldante, enquanto tomava todas nas barraquinhas, longe da água salgada. Analisando bem, o programa era de índio, mas o importante é que a cerveja estava gelada.

O acontecido foi logo no primeiro dia. Assim que chegaram no apartamento, as meninas resolveram fazer um inventário dos mantimentos comprados na véspera e perceberam que faltava sal. Seria um exagero comprar 1 quilo de sal para usar algumas poucas pitadas, mas cozinhar sem o tempero também era impensável, então anotaram mentalmente que era necessário passar no supermercado para adquirir tal gênero de primeiríssima necessidade - mas deixaram para depois.

Daí foi todo mundo para a praia e, como já dito, a cerveja estava gelada e o cardápio era recheado de batidinhas variadas, que a turma experimentava em sistema comunitário. Resultado óbvio: todo mundo esqueceu do sal. Ou quase todo mundo!

Cervejinha vai, batidinha vem, porção de camarão vai, porção de calabresa vem, o dia foi passando e os problemas do país - talvez do mundo - foram sendo resolvidos na mesa do quiosque. Até a hora que alguém sugeriu pedir uma porção de fritas para saideira e o amigo do Paiva foi taxativo: "NÃO". Ninguém entendeu nada, mas ele reforçou: "Fritas NÃO. Melhor a gente ir embora". O clima ficou meio esquisito, mas já era mesmo meio tarde e resolveram pedir a conta. O amigo do Paiva foi o primeiro a pegar a conta, quando o garçom colocou na mesa, deu uma conferida básica e deixou no lugar sem fazer comentário. Estranho. Alguém fez as divisões, arrecadou o dinheiro e a turma foi embora.

Chegando no apartamento, o amigo do Paiva, emburrado e meio cambaleando de tanta cerveja e batidinha, desvenda o mistério:

"Seus bobão, vão pedir fritas bem naquela hora? Fritas a gente come com sal, e como é que a gente ia pedir pro garçom trazer sal, se todas as mesas já tinham saleiro, menos a nossa?"

Diante da incompreensão dos presentes, o amigo do Paiva põe a mão no bolso da bermuda e tira o saleiro que ele tinha surrupiado do quiosque, triunfante: "Vocês não estavam achando absurdo comprar 1 quilo de sal pra cozinhar? Eu resolvi o problema, trouxe o saleiro cheio - e de graça !"

Mesmo considerando os 3 seguranças da barraca, não foi verdadeiramente um grande feito. Mas na cabeça embriagada do amigo do Paiva, foi o furto do século.

terça-feira, 25 de março de 2014

Desovando

O sujeito estava morando em uma cidade diferente da sua por um tempo, a trabalho, com o restante da família. A mulher, que estava provisoriamente sem emprego, cuidava da casa, da roupa e cozinhava diariamente. Mas ela precisou voltar para o emprego dela, na cidade onde eles moravam antes e ele ficou sozinho para cuidar da casa.

Sem nenhuma habilidade nos trabalhos domésticos, a primeira providência foi contratar uma diarista, para cuidar da roupa e da casa. Cozinhar não era necessário, pois ele iria se virar com lanches e os restaurantes da redondeza. No máximo, fazer um arroz com ovo, um macarrão com salsicha ou fritar um bife.

Assim sendo, ele separou todas as embalagens de gêneros alimentícios que a esposa comprou mas ele já sabia que nunca seria capaz de usar e deixou em cima da mesa da cozinha, com um bilhetinho dizendo para a diarista que ela poderia levar tudo que estivesse em cima da mesa e ela quisesse.

E ela levou a toalha!

domingo, 23 de março de 2014

Colchão de Ar

Sabe aqueles colchões que ar, que a gente usa em acampamento ou quando alguém vem nos visitar por alguns dias? Pois bem, o casal de pombinhos foi passar um feriado prolongado no litoral, no apartamento do pai da moça, próximo à praia, não muito grande, mas com dois quartos e duas camas. Porém, como era um feriadão e fazia pouco tempo que ele morava no litoral, outros parentes tiveram a mesma ideia e seguiram todos para o apartamento do sogrão.
Por sorte - ou não - o casalzinho resolveu levar o colchão inflável, afinal a segunda cama certamente seria muito disputada e com o colchão eles poderiam se encaixar em qualquer lugar.
Chegando no litoral, todo mundo já estava na praia. Cervejinha daqui, caipirinha dali, um camarãozinho para salgar a boca, um mergulho para salgar o resto do corpo, protetor solar lambuzando o rosto, pé e perna cheios de areia grudada, sunga molhada colada na bunda... aquelas maravilhas que todo mundo já fez diversas vezes na vida e ainda tem a coragem de repetir sempre que pode. 
Hora de voltar para casa. Enquanto alguns vão preparar aquela refeição que não dá para saber se é almoço ou jantar, porque o horário é de jantar mas ninguém almoçou ainda, outros continuam bebendo na sacada do apartamento e começa a fila para tomar banho; no único banheiro.
Para tentar um lugar melhor na fila, cada um usa a chantagem emocional que conhece melhor. Tô apertado(a), tô cheio(a) de areia, tô coçando, tô queimado(a), preciso ajudar no "almojanta", sou mais rápido(a), vou junto com o(a) fulano(a) pra agilizar... E começam as pequenas discussões também.
No fim, todo mundo consegue tomar banho, mas as pequenas discussões vão virando discussões médias e depois grandes discussões.
Enquanto a nossa heroína começa a brigar com o pai - dono da casa - o nosso herói está lá cuidando de encher o colchão de ar, para tentar garantir um espaço onde possa deitar mais tarde. Tipo, demarcar o território.
Em toda propaganda de colchão de ar, sempre tem um compressor que enche aquele troço rapidinho. Mas quem é que anda com um compressor daqueles quando quer a praticidade de um colchão inflável? Basta uma bombinha manual, que é mais do que suficiente. Desde que a pessoa tenha paciência, tempo e braço para ficar bombeando durante meia hora até o colchão ficar com uma consistência razoável para dormir sem travar a coluna no dia seguinte.
O herói bombeando o colchão e a mocinha brigando com o pai. O herói bombeando e a mocinha brigando. Até que ele termina de encher, no mesmo instante em que ela termina de brigar. Ele anuncia: podemos deitar! Ela decreta: vamos embora!
É claro que a briga dela com o pai recomeça. Eu vou embora! Você não vai! Eu vou! Não vai!
O mocinho, conhecendo bem a jovem esposa, resolve esvaziar o colchão o mais rápido possível - o que também é uma missão difícil, porque o ar não sai de uma só vez, ele vai escapando aos poucos, a menos que você enfie a faca no meio dele. Na verdade, essa ideia passou pela cabeça dele, mas não chegou a ser posta em prática.
Colchão esvaziado, roupas enfiadas na mala, xingamentos, choros, elevador que demora para chegar... o casal conseguiu chegar no carro e partiu para subir a serra. No meio do caminho, a mocinha pergunta a opinião do príncipe sobre a briga, ao que ele responde, simples e singelo:
- Amor, da próxima vez, briga antes de eu acabar de encher o colchão




Lixeira Improvisada

O funcionário público estava sentado lá à sua mesa, atendendo ao cidadão sem muita vontade, passando e recebendo de volta formulários e mais formulários para preencher e assinar, sempre com os mesmos dados e os mesmos termos formais e incompreensíveis aos comuns dos mortais. Mal levantava o rosto para olhar para o cidadão, protegido atrás do computador e escondendo-se na pretensa superioridade do seu cargo.

Passava uma folha e pegava de volta num ato mecânico. Passava outra e pegava de volta sem prestar a atenção. Passava outra e pegava de volta para conferir a assinatura, sem se distrair mas sem observar ao redor. E assim foi indo o atendimento, como todos os outros do dia.

Até que, ao acabar com a papelada burocrática e finalizar o serviço, o cidadão perguntou se havia um cesto de lixo.

Ainda sem levantar a cabeça e sem olhar para o sujeito, o funcionário estendeu a mão espalmada, supondo que seria algum pedaço de papel ou um grampo que precisasse ser jogado fora. Para algo possivelmente tão pequeno não era necessário abaixar para pegar o cesto de lixo, ele mesmo poderia jogar.

E era realmente pequeno, mas não um pedaço de papel inocente. Era um chiclete, saído delicadamente da boca do cidadão e depositado suavemente na mão do funcionário, com toda a saliva característica. Nojento, mas ninguém pode negar que foi um belo presente pela atenção dispensada!


sexta-feira, 14 de março de 2014

Muamba Delivery

Quando uma pessoa é aprovada num concurso nacional e entra na Receita ou na Polícia Federal, é muito comum que ela tenha que passar alguns anos trabalhando em uma cidade de fronteira. As fronteiras do Brasil costumam ser cidades pequenas, afastadas dos grandes centros, com custo de vida alto por causa da distância dos centros distribuidores, com estradas precárias, estrutura de saúde deficiente e poucas opções de lazer. Por isso os servidores mais antigos querem sair desse Brasil do B assim que conseguem, abrindo vaga para os novatos, que se sujeitam a - quase - qualquer coisa para serem agentes, delegados, analistas ou auditores fiscais.

Além da distância e das privações, uma dúvida comum dos amigos e parentes é com relação ao risco de trabalhar nesses locais, por causa das notícias de tráfico de drogas, armas, cigarros, eletrônicos, falsificações, contrabandos e descaminhos diversos. Todos ficam apreensivos com o trabalho na fronteira, a triagem de veículos, a verificação em ônibus e caminhões, os sacoleiros formiguinhas, enfim... Realmente tem algum risco, mas tudo depende da forma de se fazer a abordagem, da técnica, da postura e da educação.

E da sorte.

Um colega do Paiva tem todas essas qualidades. Já fez diversas apreensões importantes, retirou muitos e muitos quilos de produtos contrafeitos das ruas e impediu que outros tantos entrassem no território nacional, usando sua técnica, sua postura e sua educação. Mas nada se compara à sua sorte.

Como trabalha em regime de plantão, fazendo horários diferenciados e folgando alguns dias contínuos, o auditor preferiu morar em um hotel, para não ter que montar casa na cidade e poder viajar com mais tranquilidade para o lar doce lar nos períodos de folga. E em um desses dias em que estava saindo do hotel para trabalhar, já na calçada, ele foi abordado por um indivíduo meio perdido, que procurava por uma pessoa qualquer, cujo nome não é importante, mas vamos chamar de "Zé". Sem saber que estava falando exatamente com um servidor público responsável pelo combate ao contrabando, eles travaram mais ou menos o seguinte diálogo:


    - Oi, você é o Zé ?
    - Não, não sou eu não. Por que?
    - Mas você mora aqui?
    - Moro sim.
    - É que o Zé me contratou pra trazer essas mercadorias pra ele. Eu preciso entregar e receber o dinheiro.
    - O que são essas mercadorias?
    - É produto aí da Bolívia, umas roupas que ele encomendou para revender. Tem Lacoste, tem Tommy, tem Hollister, tem Dudalina...

Acho que nunca na história da Receita Federal foi tão fácil fazer uma apreensão de mercadoria sem nota fiscal e falsificada. Uma verdadeira Muamba Delivery!


quarta-feira, 12 de março de 2014

O Amor da Sobrinha

O Paiva teve uma professora de inglês que era muito divertida. Um pouco doidinha, na verdade, mas bastante divertida. Ela usava algumas gírias e expressões que a gente achava engraçadas e uma ficou famosa e se tornou o lema do garotada: "Tchau, Obrigado". Essa era a forma com que ela sempre se despedia da turma e acabando virando bordão.
Mas teve uma história muito engraçada e ligeiramente constrangedora, que ela protagonizou sem saber.
Um dia um aluno - vamos chamá-lo de Latorraca - que sempre era muito expansivo, brincalhão, participativo nas aulas dela, estava meio desanimado, cabisbaixo. Coisa que acontece com qualquer um, devia ser sono, ninguém nm tinha notado. Mas a professora notou e resolveu provocá-lo:

E ai Latorraca ! Tá triste hoje, tá desanimado. O que aconteceu? Tá sofrendo de amor? Aconteceu alguma coisa com o amor? É problema de amor?

O que ela não sabia, é que o Latorraca estava namorando a sobrinha da professora, que também estudava na mesma sala. A menina ficou corada na hora, não sabia se defendia-se ou sumia. Metade da turma achou a situação meio constrangedora, a tia lá, dando um fora falando da sobrinha, sem saber. E a outra metade achou divertido, rindo da situação.
Como o menino não se defendeu, nem explicou o porquê estava emburrado, a tia professora continuou na brincadeira, concentrada naqueles que riam e sem perceber a cara da sobrinha:

É, isso tá com cara de amor. Isso é amor. Deve ser amor, não é? Será que  a.m.o.r.f.é.t.i.c.a.  engravidou?

Ainda bem que já estava no final da aula. A tia não conseguiu mais controlar a explosão de gargalhadas que provocou na turma, até entre os que estavam constrangidos. Deu o famoso "tchau, obrigado" se achando a melhor comediante de todos os tempos, sem saber o ridículo que causou à sobrinha - que não, não estava grávida.

sábado, 8 de março de 2014

A Sopa Surpresa

O Paiva tem um grupo de amigos que sempre gostou muito de se reunir para conversar, beber e comer. E as comidas são feitas pelo próprio pessoal, principalmente a mulher do Paiva e a melhor amiga dela, ambas craques em uma porção de receitas, especialmente macarrão, crepe, galinhada e feijoada. E sopa, que o Paiva não gosta muito mas os amigos adoram, principalmente nos dias frios de julho e agosto.
E foi em um desses dias frios que o pessoal se reuniu na casa do Paiva para fazer caldo verde e sopa de mandioquinha, enquanto tomava vinho e falava mal dos que não estavam presentes para se defender.
Parte da turma costumava ficar na cozinha, acompanhando os trabalhos, enquanto que a outra parte se espalhava pela sala, só esperando para degustar as delícias. O Paiva em pessoa transitava bastante entre os dois ambientes, ora ajudando na fofoca, ora pegando os utensílios que as cozinheiras iam pedindo, que é uma das duas únicas coisas que ele sabe fazer na cozinha (a outra é lavar a louça). Mas neste dia teve uma coisa que ele não conseguiu achar: a tampinha do liquidificador, aquele negocinho redondo que fica no meio da tampa maior. As chefs reclamaram, era justo, mas se viraram com a mão, panos e outros recursos para impedir que o creme de mandioquinha saísse voando pela cozinha.
O caldo verde foi o primeiro a ser servido e já deu um probleminha: a couve se enroscou na concha e foi praticamente toda para o prato do primeiro amigo que se serviu. Pelo menos foi a desculpa que ele deu para ficar com todo o verde e deixar apenas o caldo para os demais.
Mas ainda havia o creme de mandioquinha, acompanhado por muito queijo ralado, servido diretamente no prato. O primeiro a se servir reclamou que tinha algum pedacinho de plástico no meio do creme, no que foi prontamente rechaçado pelas cozinheiras, que colocaram a culpa no saquinho do queijo ralado, certamente mal cortado pelo próprio comensal.
O problema é que a segunda colherada também veio com um pedaço de plástico, maior e mais resistente do que o primeiro. Pronto, o Paiva encontrou a tampa do liquidificador !!!! Estava no fundo do copo e foi batida junto com a mandioquinha !!


quarta-feira, 5 de março de 2014

Significados

Chamar o Brasil de "país continental" é uma frase feita, mas indiscutivelmente verdadeira. São milhões de habitantes descendentes das mais variadas culturas, com comidas, costumes e gírias diferentes e algumas vezes deliciosamente estranhas.
Mas às vezes podem gerar situações constrangedoras.
Um amigo do Paiva, por exemplo, já ficou incomodado com a profusão de "paçoca" nos cardápios dos restaurantes de Fortaleza/CE - demorou para descobrir que não tinha nada a ver com o doce de amendoim, mas sim com um tipo de farofa salgada - e envergonhado com o "Pica Lo Macho" dos cardápios de Corumbá/MS.
Outro amigo, entretanto, não teve tanta sorte quando visitou as Serras Gaúchas pela primeira vez. Como era de praxe, queria levar uns presentinhos para a família, algumas lembrancinhas típicas da região, algo simbólico e barato ao mesmo tempo.
A solução parecia ter caído do céu num restaurante em que o sujeito parou para almoçar. Circulando entre panelas de ferro e outros utensílios pendurados como parte da decoração, eis que surge uma porta com uma placa reveladora: prendas.
Ora, no interior de São Paulo a palavra tem um significado:

Brinde distribuído aos vencedores de brincadeiras em festas

Ou seja, um bibelô, uma coisinha barata, exatamente o que o cara precisava.
Foi direto rumo à meta, abriu a porta da salinha e descobriu o outro significado da palavra:

Mulher ou moça natural do estado do Rio Grande do Sul

Não foi nada agradável entrar no banheiro feminino e ainda ter que explicar a ignorância do caipira paulista para as prendas presentes e para os seguranças do local.


segunda-feira, 3 de março de 2014

O Chuveiro da República

República de adolescentes é um ambiente totalmente indescritível, principalmente para quem nunca viveu em uma, e com os amigos do Paiva não podia ser diferente. Os três rapazes nunca tinham morado sozinhos, nem feito qualquer coisa que prestasse nas suas respectivas casas, a não ser estudar e usufruir do conforto do lar do papai e da mamãe. E foram tão bons nisso que passaram no vestibular e tiveram que morar fora: sucesso na faculdade e desastre na administração do apartamento.
Dormir era fácil, afinal os coxões eram novos - e as colunas cervicais também. Escolher uma roupa também não era difícil, porque ninguém se preocupava com os amassados.
Passar uma vassoura na sala era mais complicado, mas ninguém se importava com a poeira.
Cozinhar era uma missão quase impossível, tanto pela falta de conhecimento como pela falta de vontade, mas principalmente pela falta de panelas limpas.
Mas nada se comparava, em questão de horror, com a situação do banheiro da república, depois de apenas duas semanas - e nenhuma limpeza. O lixo era trocado (quase) diariamente; e só. E eis que o chuveiro parou de funcionar. Provavelmente entrou em greve por causa da sujeira, ou teve um curto em função dos gases acumulados.
Como ainda era começo de ano - verão, outono - a água quente não fazia falta e a molecada se virava com água fria mesmo, até porque quanto mais rápido fosse o banho, menos tempo eles passavam dentro do banheiro prestes a ser interditado pela vigilância sanitária. E ninguém sabia trocar chuveiro, é claro.
Eis que, depois de uns 10 dias tomando banho gelado, o pai de um dos guris resolveu salvar o filho e os amigos e levou um chuveiro novo. Parecia um presente de Papai Noel, a garotada toda ansiosa para voltar a tomar banho quente e até interessada em aprender a trocar o chuveiro, afinal podia voltar a acontecer em pleno inverno.
E a primeira coisa que o pai fez, com toda a sua experiência, foi procurar a caixa de disjuntores, para desligar o circuito do chuveiro e poder fazer a troca com segurança. Eis que os disjuntores estavam desarmados!!! Foi só armá-los e a água voltou a sair quentinha.
Difícil saber quem ficou com a cara mais esquisita: se o pai que perdeu a viagem e descobriu que seu filho e os colegas dele eram uns bobões ou os garotos que ficaram 1 mês tomando banho gelado por burrice - e continuaram sem saber trocar chuveiro!!!

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Trocando as Bolas

Na hora que a loiraça entrou no cartório eleitoral, tornou-se o foco de todos os olhares de quem esperava para ser atendido. As cadeiras eram incômodas, a temperatura desregulada, não havia revista para ler e toda hora a atenção era desviada das telinhas dos celulares para a telona do monitor de chamadas, portanto a presença de uma figura tão singular chamou mesmo a atenção de todos.

Em razão do tipo de serviço que ela solicitou na triagem, nem teve que esperar muito e foi chamada rapidamente. E entrou toda rebolativa na área das mesinhas destinadas ao atendimento, dominando o ambiente também dos funcionários. Especialmente do servidor que a estava chamando, solteiro e há diversos dias longe de casa, que começou a salivar com vontade vendo a presa se aproximar. "Essa é do meu número" foi o primeiro pensamento que lhe passou pela cabeça.

A apresentação foi curta, apenas um "bom dia" protocolar, insuficiente para descobrir a idade, o estado civil e outras coisas que o atendente estava interessantíssimo em saber. Mas, até aí, tuuuudoo bem.

O serviço solicitado era bem simples, correção de nome no título de eleitor, atividade que se faz com base no documento de identidade ou certidão de nascimento. Mas ao invés de entregar um desses documentos, a loirona entregou uma decisão judicial. Incompreensão no ar... Mas como decisão judicial é coisa séria, o servidor resolveu prestar atenção na papelada.

Mas só conseguiu prestar atenção no primeiro parágrafo, depois disso perdeu completamente o rebolado. O serviço solicitado estava correto, a decisão era mesmo para correção de nome. A loiríssima passou a se chamar Beatriz, livrando-se de vez do nome original de fábrica: Waldemar !!!!!!

Difícil para o funcionário foi voltar a trabalhar depois do susto, desiludido com a surpresinha proporcionada pela "Bia" e incomodado com a zoação dos colegas.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Flores e Cores

E o Paiva tem um afilhado com 3 anos e meio, muito esperto para a idade, como é comum hoje em dia. As crianças parecem que já nasceram com atualização automática de software, têm umas sacadas que a gente não tem nem ideia de onde surgem. A diferença é que o afilhado do Paiva, além de esperto - e bonito, mas isto é outro causo - é meio machista.

Outro dia, o padrinho estava passeando com ele e a madrinha, de carro, e passou por um lugar que tinha um cheiro esquisito no ar, um fedor mesmo. O cheiro vinha da rua, mas a madrinha resolveu fazer uma gracinha e perguntou quem é que tinha feito pum.

O primeiro a se defender foi o Paiva, argumentando que não havia sido ele, porque o seu pum cheirava rosas. É claro que ele estava falando da flor, mas o Mateus não entendeu a ironia e também respondeu rapidinho:

- E o meu cheira a "azuis", porque eu sou homem.

Falar o que, depois dessa ?!?!

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Correndo atrás

O Sr. Getúlio era conhecido de toda a agência bancária. Fazia muitos anos que ele ia pelo menos uma vez por semana fazer depósito, saque, pegar talão de cheques, tirar extrato, enfim... uma porção de coisas que poderiam ser feitas no caixa eletrônico mas que o Sr. Getúlio preferia fazer no caixa. Ele dizia que era porque não confiava na tecnologia, mas todos acreditavam que era para ter com quem conversar.

E a vida ia seguindo normalmente, até o dia em que o Sr. Getúlio chegou contando que estava se aposentando, que iria fazer uma viagem rápida com a patroa e depois apenas cuidar dos netos. E pediu para sacar todo o dinheiro que tinha na conta.

O caixa achou estranho, porque ele nunca tinha feito isso, sempre sacava mais ou menos a mesma quantia, suficiente para a semana, e tirar tudo de uma vez não era normal. E pareceu pior ainda quando ele pediu em notas pequenas, que exigiriam uma quantidade maior de notas e fariam um volume grande. Mas o Sr. Getúlio era um cliente antigo, amigo dos funcionários, e não custava agradá-lo - ainda que ele estivesse praticamente fechando a conta.

A preocupação do gerente era com a segurança do cliente, pois o dinheiro daria diversos pacotes, impossível de carregar nos bolsos, e por isso ele se aproximou do caixa e perguntou como ele faria para levar aquela grana toda.

O Sr. Getúlio deu uma risadinha irônica e tirou uma cordinha tipo barbante do bolso, dizendo que estava tudo sob controle. Foi empilhando as notas, à medida que o caixa ia lhe passando o dinheiro, e amarrando com a cordinha, fazendo diversos montinhos. Ninguém estava entendendo nada e o pessoal começou a ficar curioso, mas não tinham coragem de perguntar.

Quando todo o dinheiro já havia sido colocado em cima do balcão e devidamente empilhado e amarrado, o Sr. Getúlio agradeceu, se despediu, derrubou tudo no chão e saiu puxando o dinheiro pela cordinha.

O gerente se aproximou de novo, assustado, e perguntou o que estava acontecendo, temendo pela segurança do cliente, mas a resposta o deixou desconcertado:

"A vida inteira eu corri atrás de dinheiro; agora é hora do maldito dinheiro correr atrás de mim".

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Causo

O Paiva é um sujeito cheio de causos, quase sempre mais ou menos verdadeiros, que ele presenciou, ouviu dizer ou inventou. Mas pode ser que não seja bem assim, quem vai saber ??!?!?
Causo (substantivo masculino): a causa ou o motivo; narração curta, geralmente falada; conto, história, caso; o ocorrido, o acontecido.